sexta-feira, setembro 30

Álbum de família


Tio Hugo e Tio Néstor jogando uma descontraïda partida de gamão durante um churrasco de batizado.

Grandes ditos: «A única vantagem real do brasileiro é ser sul-americano sem precisar ter de falar espanhol». Jorge Batlle, ex-presidente uruguaio.

Corpo Nacional dos Fotógrafos Kamikaze: Argentina, patacones, panelazo, Hugo Chavez, Chaves do Oito, refinarias venezuelanas, golpe articulado pelos Estados Unidos, Juan Domingo Perón, cadáver de Evita, estratégia golpista, como fazer uma bomba caseira, Real Academía de la Lengua Española, movimentos da esquerda messiânica.

quinta-feira, setembro 29

Galeria dos horrores: Os Diabos de saia

A queridíssima Maria da Conceição Tavares

Os diabos de saia, por ordem alfabética, não de magnitude:
Machadada Presse-Osservatore Venardo

Vida longa, Maluf. Na cadeia, é claro.
Aldo Rebelo, Presidente do Congresso pelo Estadão.

Grandes ditos: «A Argentina é só uma fazenda vagabunda.» Maria da Conceição Tavares, economista portuguesa e usuária de ferradura.

Real Confraria dos Grandessíssimos: Economia, Análises do Mercado, Inquisição Espanhola, bondage, comunismo, teoria da conspiração, o perigo do comunismo, Olavo de Carvalho, Ruralistas, Estado de Israel, oligopólio, Maranhão, dama de ferro, God save the Queen.

quarta-feira, setembro 28

Carne-de-canhão

— Helmuth, ponha mais poloneses no canhão, jetzt!
Herr Kaptain, não há mais. Pode ser um atendente de telemarketing?

«Tutti morimmo a stento
ingoiando l’ultima voce
tirando calci al vento
vedendo sfumar la luce.»
(F. De Andre, Ballata degli impicati)

Carne-de-canhão é um termo um pouco em desuso. Em desuso porque a sanha beligerante das grandes potências havia se acalmado um pouco (eu disse, havia), mas mesmo hoje, a guerra não é igualitária como fora um dia, quando havia baixas de ambos os lados das fronteiras, em número bem similar, não como hoje, em que morre meia-dúzia de americanos e uma bela centena (ou milhar, pois tanto se lhes dá) de iraquianos, afegãos ou qualquer outro habitante de rincão ignoto.
Naquela época, no Entre-guerras, carne-de-canhão era o povo mandado às trincheiras e à guerra, «morrer pela Pátria»; e – se não me falha a memória – viravam beefsteak tartar, segundo Brecht na Ópera dos Três Vinténs.
Evidente que a guerra existe, mas não como antigamente. É localizada e a Grande Potência só ataca os pequeninos que oferecem pouca resistência por tenazes que sejam; mas o conceito de carne-de-canhão é aplicabilíssimo à nossa mordaz e vociferante sociedade de consumo.
Depois dos comentários que fiz sobre o Programa de bolsistas do Metrô de São Paulo (21 de setembro de 2005, quarta-feira última), ontem outro absurdo berrava das páginas do Diário Oficial. Inclusive, aproveitando a deixa, a propaganda governamental nos tempos pós-modernos é extremamente inócua; principalmente com o Estado a comportar-se como uma empresa privada e a bancar essa tão ridícula responsabilidade social; em suma, o Estado se comporta como a Natura. Fatos alardeados como extremos acessos de bondade do Governo do Estado são somente deveres básicos e essenciais (e mínimos, diga-se de passagem) que negligenciados durante anos, aparecem como uma mão paternalista, uma dádiva.
Para mim, ao contrário, tem o aspecto da esmola dada de má-vontade, o que torna tudo ainda mais revoltante. Mas vamos à notícia: saiu publicado na capa do Diário Oficial do Estado de São Paulo de ontem uma reportagem (1) sobre uma certa Educação para o Trabalho, um programa mantido pelo Senac (2) e pela Coca-Cola Femsa. Transcrevo parte do artigo:

«Grupo de 121 jovens (sic) com idades entre 15 e 24 anos, moradores dos arredores do Parque Estadual Fontes do Ipiranga […] tem um motivo especial para comemorar. Após seis meses de freqüência às aulas do Programa Educação para o Trabalho, receberam (sic) na semana passada o diploma de conclusão do curso. A iniciativa, dirigida a adolescentes cujas famílias têm renda de até dois salários mínimos […]. O programa prevê a capacitação de 300 participantes por ano, que saem do treinamento em melhores condições de enfrentar o mercado profissional. […] Ministrado em horários diferentes dos da escola, é dividido em oito módulos: Estação Qualidade de Vida; Estação Apresentação Pessoal; Estação de Trabalho e Atitude Empreendedora; Estação de Informática […], Estação de Organização e Estética de Ambientes; Estação de Tecnologia das Transações Comerciais; Estação de Recepção e Atendimento a Clientes e Estação de Vivência, que possibilita aos jovens experiências em situações reais de trabalho. […] que os beneficia com bolsa-auxílio de R$ 60,00 mensais. (negritos nossos)

Abstenho-me de comentar a metodologia desse curso a partir desse nomes-chavão tão pós-modernos. O valor dessa pretensa bolsa, revoltante. O prêmio para os cinco melhores do curso é uma vaga de estágio no Senac.
O que mais me dói é ver que nas fotografias, que ocupam a parte central da página, rapazotes e rapazolas felizes. Qual vantagem, Cristo? Isso é a tão propalada responsabilidade social? Parece-me que todas as iniciativas dessa responsabilidade apontam para formar e criam abelhas-operárias capitalistas. Ou só porque são pobres a faixa atingida, não têm direito a ser nada melhor? Até quando as pessoas vão ficar quïetas frente a esses magnânimos e solenes absurdos? Quando o Estado vai voltar a comportar-se como poder público e fazer o que lhe compete, ou seja, a busca por uma sociedade mais justa a partir da representação popular que é, do poder que emana do povo para o Governo, e parar com essas ações que é formação de mão-de-obra barata semi-qualificada para grandes corporações. É formação para carne-de-canhão.
Gostaria de saber que a Coca-cola teria coragem de pagar € 20 mensais para algo similar na Europa; as pessoas a esnobariam. Mas no país dos néscios, famintos e miseráveis, ávidos por argento, é fácil fazê-lo.

(1) Pode-se chamar algo publicado nas capas e contra-capas do Diário Oficial de reportagem? Fazemo-lo por mero bom-senso.
(2) O mais engraçado é lembrar que o Senac surgiu a partir da tentativa getulista de corporativizar a Sociedade durante o Estado-Novo (1937-45), corporativismo no sentido antigo da palavra, nada com relação à governança corporativa, fenômeno moderno, que rima com lambança capitalista.

Grandes ditos: Cartão de crédito serve para passar manteiga no pão. Olavo Setúbal, presidente do Banco Itaú, mais uma instituição chupim agarrada às vossas calças e que usa os telefones para torturar a população com telemarketing de cartões de crédito.

Incendiários Anônimos (eles já puseram fogo no salão da Igreja durante uma crise coletiva): canalhices, Getúlio Vargas, Serviço Nacional do Comércio, mendigos de São Paulo, armamento militar, corrida armamentista, imperialismo, vagas para atendente de telemarketing, velhas.

segunda-feira, setembro 26

A vaca de Caxias

Realmente não entra na minha cabeça essa vacas de concreto (são de concreto? pelo menos o suporte é) espalhadas pela Paulópole. Todo dia há uma no meu caminho, no Pátio do Colégio, bem defronte ao ponto de ônibus, ao lado da banca de jornal. Essa do Pátio tem uns motivos rupestres.
No começo, pouco me importava da vaca, mas depois duns dias, parece que ela tem se deslocado, cada dia mais perto do prédio do Primeiro Tribunal de Alçada Cívil. O pétreo bovino está obrigatoriamente na visão de quem está no ponto; se você se distrai e ao invés de conservar os olhos fixos na praça da Sé, de onde vêm os ônibus, primeiro seu olhar recai sobre a banca de jornais e conseqüentemente, deslocando-se a vista para a esquerda, cai o olhar sobre a infame vaca de concreto. Qual é a função dela? Como tudo de arte moderna, provavelmente nenhuma, não informa, não diz nada; os desenhos rupestres, talvez alguns os identifiquem como tal, tendo em conta as pessoas que pegam ônibus ali tudo dia, sempre os mesmos. Tem um moço quase sem queixo que lembra o Noel Rosa, uma moça que sempre o conhece, que tem uma face assaz abrutalhada, como um aborígene canibal. Sinceramente, tenho medo de que ela me morda um dia.
Pois bem, as pessoas que pegam os ônibus no Pátio do Colégio não diferem muito do rebanho de concreto, pois se mexem; talvez sejam pedras falantes, não sentem o que está ao redor e conversam fatuidades que se esfumam no ar como vapor.
Mas pouco me importa quem pega ônibus comigo, pois estou falando da vaca de concreto, daquela estúpida vaca de concreto e seu obsceno úbere petrificado, pintada como se fora pedra e aplicados sobre, os desenhos que simulam arte rupestre. Como já vinha dizendo, no começo, nos primeiros dias, pouco me importava. «Uma vaca de concreto! Que asnidade!». Mas passados uns dias, como eu já disse, a vaca estava cada vez mais deslocada, em direção ao tribunal. Seria uma vaca com pretensões a advogada?
E afinal, o que significa aquela vaca, santo-deus? Será uma conspiração dos indianos? Certamente não; païses que têm bomba atômica não precisam dar-se nuances tão ridículos. Mas parece que, a inutilidade da vaca não foi precebida só por mim. Terça-feira passada vi um japonês tirando algumas fotografias com o celular; na quinta, uma feliz mãe pôs seu feliz rebento sobre a vaca. Lembrei, com um sutil sorriso da minha vó que dizia montar nas vacas quando era pequena, coisa que não se pode fazer. Mas aquilo era uma vaca de concreto, ou seja, dali não sai leite e nem ficará desconjuntada pelo peso nas costas. A criança pareceu apreciar a vista de cima do insólito ruminante, tanto que para arrancá-la de lá, a mãe teve um tremendo trabalho.
Mais uns dias, eu subia de-manhã pela General Carneiro, como todo dia útil, para pegar o coletivo no Pátio do Colégio. No no alto da ladeira, giro a esquerda e dou de cara com a já consueta vaca, mas no seu dorso havia algo não tão consueto - bem, se estivesse desmontado da vaca, caïdo por um canto, sentado com a mão estendida pedido esmola, tudo bem, seria normal. Sim, havia um mendigo, sujo; não, sujo é pouco: imundo, barbado, cheio de folhas, grãos de sabe-lá-deus-o-quê na barba, trajando igualmente imundos um chapéu panamá, um surrado e puïdo paletó, calça de risca e pés descalços cobertos de crostas pretas. Havia ao redor uns curiosos (como era de se esperar), o mendigo se balouçava para frente e para trás, como se realmente cavalgasse. Cheguei mais perto e me pus junto dos curiosos.
- Valha-me Deus! Mil infernos ardem! Avante, adiante, tropas!
Olhava para trás, como se houvesse todo um exército atrás.
- Onde está o banana do Conde D’Eu?! Ele pensa que vai se livrar assim, só porque é genro do Imperador? Nada disso!
Da Praça da Sé vinham correndo três policiais militares. O mendigo continuava em cima da vaca, solenemente parou para observar a assistência, com olhar soberbo e cara erguida, começou a recitar:
- Humaitá... Cerro Corá... Riachuelo! Viva o Exército Imperial!
A maioria das pessoas ao redor nem sabiam do que falava o andrajoso, mas se riram da referência ao Império. Começou a remexer-se loucamente do alto da vaca e tirou de um cabo de vassoura que trazia atado à cintura, brandindo-o contra a assistência, que abriu espaço.
- Paraguaios, paraguaios malditos! Que exército porco que nem sapatos tem!
Os policiais agarraram o cavaleiro (ou o vaqueiro, o que quer que seja) e o desmontaram, pondo-o ainda sentado no chão.
- Como ousam! Biltres, pérfidos, traïdores!
- Fica quïetinho aí, meu. - respondeu calmamente o policial.
- Vocês sabem quem sou eu, por acaso?
Os policiais entreolharam-se; o mesmo fez a assistência que estava muda.
- Vocês por acaso nunca passaram pela Praça Princesa Isabel? Tem uma estátua minha imensa lá! Eu libertei vocês do Solano, suas bestas.
- Solano? Que Solano? - perguntou alguém da assistência.
Mas o Duque dos andrajos já havia se levantado e agora pôs-se de corrida atrás de um trólebus, berrando.
- Solano! Biltre, volte aqui! Você não conseguirá escapar de mim e do fio da minha espada. Tenho os cachorros do exército todo pra alimentar com as suas tripas! Solanoooo...
E sumiu em direção do largo São Bento, sempre berrando pela cabeça de Solano López e somente eu fiquei parado olhando, os policiais já enfiavam pela rua do Tesouro e os curiosos tinham cada um tomado seu rumo.

Grandes ditos: «Militares não têm espírito esportivo.» João Goulart, presidente deposto.

Estrebaria Nacional: patentes, títulos nobiliárquicos, ex-presidentes, amadoras, Guerra do Paraguai, Duque de Caxias, Cowparade, centro de São Paulo, Mosteiro de São Bento, pomada de peixe-boi da Amazônia, Visconde de Taunay, golpe militar, Zé Celso.

domingo, setembro 25

As ricas horas do Duque da Lizeânia Ocidental

I.

(diálogo entre o Duque e o peixe porta-voz da Coroa)
— Alteza, por que as pessoas ficam propensas a fazer e dizer tantas asnidades nos finais-de-semana?
— Meu caro osmerídio, é porque os neurônios só funcionam em horário comercial, de segunda a sexta, das 8 às 18.

II.
(para não dizer que não falei de peixes, extraído da Enciclopédia Larousse-Cultural, tomo 9, p. 2129) Eperlano s. m. (do fr. éperlan) Osmerus eperlanus. Peixe das costas européias do Atlântico Norte, que sobe os rios na época da desova. A carne, com estranho cheiro de pepino, é pouco consumida. (Família dos osmerídeos)

Grandes ditos: «A Áustria? Se não fosse a terra do Führer seria uma grande merda». Hermann Goering.

Corpo Nacional de Apedrejadores: As ricas horas do duque de Berry, bobó de camarão, ictiologia, culinária francesa, anatomia cerebral, horário de funcionamento, dias da semana em albanês, calendário lunar, fauna excêntrica, geografia da Europa, Österreich, Wolfgang Amadeus Mozart.

sexta-feira, setembro 23

Doutrinas aplicadas à vida

(ou Realismo Socialista para a classe-média)

(«À luta, filhos da Pátria!»)

Realismo socialista é:
  • empurrar a sua mãe da escada enquanto canta o Hino Nacional ou alguma música proletária;
  • subir na escada comum sozinho, enquanto o populacho se espreme na escada rolante do Metrô;
  • ler o jornal de ponta-cabeça;
  • oito pessoas num elevador onde só cabem seis;
  • fazer armas nucleares a partir de matéria-prima de escritório (clipes e elásticos);
  • escrever textos ilegíveis e pintar quadros horrorosos com cenas de trabalho;
  • andar de social mas sempre em mangas de camisa;
  • dizer que adora o que faz, mas não vê a hora de se aposentar;
  • fazer movimentos ágeis e certeiros com pires e xícara enquanto toma café (preferencialmente diante de uma vidraça para poder observar melhor as impressões);
  • ir a vida toda ao mesmo barbeiro e ouvir os mesmos comentários sobre política;
  • saber ser cordial e benévolo com povos inferiores, preferencialmente, juntá-los todos por Repúblicas Federadas Socialistas;
  • ser uma bicha fissurada em mecânicos musculosos, de macacão e todos sujos de graxa.
Grandes ditos: «Comunistas não tomam banho; todas as ações do Governo Chileno são pela profilaxia.» General Augusto Pinochet.

Malvados fresquinho. Merece nota.

Ordem dos Caceteiros Descalços: Stálin, Josip Broz Tito, fazenda coletiva, rolha de cortiça, Luís Carlos Prestes, Intentona Comunista, padres pedófilos, transporte público, urânio enriquecido.

quinta-feira, setembro 22

Diga «xis»

Em virtude da efeméride natalícia de Sua Alteza, ela está com a agenda cheia; a postagem passa, pro tempore, para mim, Eperlano, porta-voz da Coroa. Trago ao conhecimento do público as seguintes notas:

Sua Alteza comenta a Respeito da lei n.º 12.044, de 21 de setembro do corrente, publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo (figura ao lado) e proclama a cidade de Tupã como pólo estadual da Fotografia (?!): Realmente, a inventividade de suas Excelências Deputadescas a surpreende cada dia mais. Antes do início da agenda do dia, levei a nova para Sua Alteza, que compungido de espasmos de riso, deu o imprimatur para a publicação no blogue oficial. Quando passar por Tupã, não esqueça de sorrir para as câmeras de fiscalização da rodovia. E também curioso o sobrenome do Excelentíssimo Deputado: lembra o de alguém, não?

A Casa Real estuda a criação de algumas condecorações e ordens, a decisão só foi adiada pela já citada efeméride. Sua Alteza reunir-se-á no sábado com o Conselho de Decanos da Câmara dos Condes para deliberação. Sabe-se que as comendas condecorarão os cretinos eméritos (independente da nacionalidade) e vagabundos egrégios, que serão condecorados nas categorias de criação inútil e maior calhordice. Boçais do mundo, uni-vos!

Sua Alteza aproveita ainda para congratular o povo brasileiro pela renúncia de Severino Cavalcanti; espera ainda que o povo o queime em praça pública ou faça abajures com seu coro.

Ainda em tempo: Bob Jefferson e Ônix Lorenzoni, deputados federais. Dá pra confiar em ex-gordo e ex-careca?

Grandes ditos: «No alto desse palitão, só falta a azeitona». Severino Cavalcante quando da sua visita a Paris, referindo-se à Torre Eiffel.

Secretaria Nacional de Combate à chocolatria: Jânio Quadros, Jubileu da Rainha Elizabeth II, recortes de jornal, Hemeroteca Nacional, Congresso Nacional, Prêmio Institucional, Cultura do Trabalho, Guerra dos Cem Anos, La Traviata.

quarta-feira, setembro 21

«E que na morte vos persigam as nossas memórias»

«Querida, hoje eu usei Korega, venha ver!»

Confissões


Antônio De’ Marchi, marinheiro aposentado:
Eu bato nos testemunhas de Jeová. Quando eles vêm na porta, eu me escondo atrás da lixeira e zás!… Já há dois alimentando as minhas petúnias, e forro as paredes do meu quarto com as folhas das revistinhas deles…
João Hermenegildo Boucinhas, aposentado por invalidez:
Queimei dois membros de torcida organizada que estavam brigando e destruindo o meu jardim… joguei gasolina neles e ateei fogo; a carne calcinada, deitei para os pitbulls dos vizinhos…
Jacó Kreutzbaum, ex-taxista e especulador imobiliário:
Em 1986, depois da Redemocratização, soltei, furtivamente de um caminhão de circo, dois elefantes que estavam no cio em plena Radial Leste, perto do viaduto da linha do trem, na hora do rush. Tentaram copular com vários fuscas, para medo e terror dos ocupantes dos veículos… se eu me arrependo? Nem um pouco! Foi o meu protesto em favor da Revolução de 1964.

O Metrô que vá às favas antes que eu me esqueça

Saiu no Diário Oficial do Estado de São Paulo de hoje (volume 115, nº 179 de 21.09.2005), que a Companhia do Metropolitano de São Paulo, inaugurou nas estações Paraíso e Jabaquara, balcões de informações, que funcionam das 7 às 19 horas, que têm em média de 58 mil solicitações, etc. e tal. A mão-de-obra para os balcões é fornecida por um programa de bolsa-trabalho do Estado, o Programa de Educação para o Trabalho (PET). Pagam para cada pessoa, que tem obrigatoriamente entre 18 e 22 anos, a fabulosa quantia de R$ 152; noves-fora os benefícios: cesta-básica, vale-transporte, auxílio-refeição e (ó!) um bilhete de serviço do Metrô.
Realmente a benevolente política de sub-emprego e salário-de-fome do Governo do Estado me comove. Garanto que no dia do lançamento do Programa houve uma solenidade com boca-livre para as Autoridades e respectivos puxa-sacos.

Grandes ditos: «Marinha boliviana? Isso existe?», anônimo chileno.

Nota: o título é a tradução de um verso de Campanades a morts, de L. Llach.

Confraria dos Padeiros Celibatários: Castelo Branco, Garrastazu Médici, tolerância religiosa, Circo Escola, anti-semitismo, atentado à estação da Vila Esperança, A Cabana do Pai Tomás, alforria.

terça-feira, setembro 20

Dotze raons per ésser català

Como circulam aqueles correios eletrônicos com dez motivos de pertencer a tal ou taloutra nacionalidade, faço um com os doze motivos para ser catalão. Divirtam-se:
  1. Joan Manuel Serrat;
  2. possuir um cancioneiro popular com quase mil anos de história;
  3. Lluís Llach;
  4. ter Barcelona como capital;
  5. Antoni Gaudí;
  6. poder ler Tirant lo Blanch no original;
  7. José Carreras;
  8. Jordi Savall e a Capella Reial de Catalunya;
  9. ter o onze de setembro não como dia do medo;
  10. Joan Miró;
  11. ter uma cultura e língua pujantes que não se dobraram nem a 40 anos de Franquismo, e
  12. ser espanhol e não ter de necessariamente falar espanhol.
Viu?

Grandes ditos: «O espanhol é uma língua semita com algumas influências latinas.» Messer Tartufo, apud S. A. R.

P. S.: hoje a joça do Blogger não está aceitando o envio de fotografias; e eu que havia separado uma bela da Catedral da Sagrada Família.

Real Corpo de Datiloscopistas: Catalunha, Generalitat de Catalunya, València, Diada de Catalunya, llengüa catalana, Francesc Faus, Mediterrâneo, ilhas Baleares, Andorra, els Pirineus.

segunda-feira, setembro 19

Mondo Cane (III)

(«Esse é nosso último modelo, meu filho.»)
I.
No Dops, em algum dia entre 1973 e 1974.
- Mas afinal, onde estão todos os seus amigos?
- …
- Diga! Para onde foram?
- Estão todos com disenteria… Dei-lhes canapés com maionese vencida…

II.
- Está tudo em greve… tudo parado, tudo fechado.
- Até o restaurante?
- Sim… até o restaurante. Está cheio de grevistas lá…
- É… um bem-passado até que não me descia mal…

III.
O marido entra em casa farejando o ar.
- Boa-noite, querida, que fizeste para o jantar?
- Fiz fondue de queijo com as suas meias sujas, idiota!

IV.
Um ateu está a regalar-se com uma feijoada num restaurante. Visivelmente satisfeito, com a caipirinha a valsar-lhe pelo cérebro e com as mãos engorduradas, vê que na mesa do lado, instalam-se dois padres. Dirige-lhes a palavra.
- É o que eu sempre digo, Reverendíssimas, se as hóstias tivessem o gosto dessa maravilhosa lingüiça calabresa, todos seriam católicos…

Grandes ditos: «Pense bem no seu emprego: o que você faz pode ser feito em metade do tempo e um décimo do preço por um chinês esfaimado». Andrea Villagrau, Presidente da Federação das Indústrias do Principado da Venárdia.

Real Corpo de Acendedores de Fósforo: Cristianismo, Fiesp, nouvelle cousine, Cut, Romeu Tuma, Dom Cláudio Hummes, Polituro do Partido Comunista Chinês.

sábado, setembro 17

Le vôtre marmite, monsieur Maluf

Em comunicado oficial da Coroa, S. A. R., o Príncipe da Venárdia lamentou que o senhor Paulo Salim Maluf tenha sido preso. Sua Alteza era partidário da execução sumária.

O Ilustríssimo Senhor é preso, e preso, tem a desfaçatez de tripudiar ainda com o povo (mesmo dentro da cadeia, que admirável!), dizendo que a comida que lhe servem no cárcere «não daria nem para um cachorro». Eu o deixaria uns dias sem comer, ou lhe alimentaria somente com comprimidos efervescentes.

J’ai malufé, Tu as malufé, Il a malufé. Nous avons lu: Le Monde.

Talvez o Google Maps sirva realmente para algo.

Grandes ditos (1): «Os deputados são como as prostitutas, e cá entre nós, ainda prefiro as prostitutas.» Conde de Vilanova i Geltrù, engraxate

(1) Além dos disparates habituais, será introduzido nessa pocilga virtual o salutar hábito de fornir de doutrinas o leitor, por intermédio de frases avulsas. O que é bom e instrutivo.

Fornicadoria Regional de Villa Venarda: marmitex, hambúrguer de minhoca, Regime Militar, Caco o sapo, Prefeitura do Município de São Paulo, aparelhos para cozinha.

sexta-feira, setembro 16

Burocracia inspiradora

A burocracia enraizada nos estimula e nos inspira para a concepção artística, de como encarar a burocracia pela lente da arte. E aí está a bela-merda que dá.

(extraído da Encyclopaedia Venarda)

Real Academia Venarda de Pirófagos: art noveau, impressionismo, Segundo Império, vida íntima de Dom Pedro I, As barbas do imperador.

quinta-feira, setembro 15

Emagreça cantando

Sim, sim; não foram as pessoas certas – nem as mais indicadas – que o fizeram, mas a cassação do mandado do Deputado Federal Roberto Jefferson (PTB-RJ) foi merecida. Agora há um pulha a menos, só faltam ser cassados os outros 512. Foi interessante, mas um pouco fastidioso, acompanhar a votação na íntegra, o que fiz pela TV Senado: uma tribuna cheia como galinheiro e a mulher de vermelho que cantava os número de votos sim monotonicamente; tanto que volta-e-meia, do fundo da poltrona, eu soltava um bingo! Evidente que logo os números entraram na centena e a blague não era mais tão verossímil.
E quanto papel eles gastam, uma cédula e aqueles envelopinhos irritantes e rumorejantes; mas a minha maior decepção foi a impassibilidade de Suas Excrescências: eu imaginava pelo menos uma pequena balbúrdia quando dos votos não, mas nada. Diante da mesa, um bando de parlamentares ciscava com seus celulares. Um, devidamente com o celular preso à orelha, fez um desavergonhado tchau para a câmera. Não contente, fez um segundo.
Mas o que importa é que o importante e necessário foi feito: Bob Jefferson, fora; agora, além de ex-gordo é também ex-deputado e passaremos dez anos em pax jeffersoniana, ou seja, sem vê-lo a comer da manjedoura do Estado. O máximo que pode acontecer é que o ex-parlamentar lance um disco com cançonetas, com a sua já tão consagrada voz, ou lance outro disco com a íntegra dos seus discursos.

Esperemos agora, a vez do Presidente do Congresso, Severinho Bola-de-bilhar, na caçapa do meio.

Veja o que disse o Estadão e a Folha.

Real Chouriçaria Venarda: Tak 500, lipoaspiração, ’O Sole mio, Torna a Surriento, Herdeiros de Brizola, Fernando Collor de Mello, Severino Cavalcante, mula-sem-cabeça, crise na Albânia, jornalismo reacionário.

quarta-feira, setembro 14

Quem te viu, quem te vê


Anos de chumbo. O maestro do Milagre Brasileiro era o todo-poderoso Ministro da Fazenda Antônio Delfim Neto; gordo verme do Regime Militar, autor do actual endividamento. Sendo Governo, era também Arena (Aliança pela Renovação Nacional), oposição ao MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Como quem não trai seus princípios – por piores que sejam – Delfim enquistou-se primeiramente no PDS e no seu sucessor, o PPB, hoje PP, do egrégio Dr. Paulo Maluf.
Observando-se as vicendas acima, Delfim Neto pertencia à canalha do Regime Militar, que deveria ter sido toda exilada quando da volta de democracia; ontem, porém, passando rapidamente por diante do televisor, vi acidentalmente parte do telejornal (nem me lembro qual) e quem estava na tela, com sua cara gorda e flácida? O próprio Delfim Neto. Diante desse deus ex machina, fui obrigado a parar – ou as minhas pernas se estacaram – e ouvi a grande nova: Delfinzinho estava de mudança: do PP malufista para o PMDB.
Confesso que, apesar dos pesares e da desilusão com a política, a notícia foi estarrecedora. Como? Pior de tudo, quem estava falando junto com Delfim Neto? Orestes Quércia, o Emérito Governador de Mogno. Pensei que não fosse viver tanto para poder testemunhar isso. Primeiro, a queda do Muro Eterno, depois, a queda de Collor, o Euro, a queda de Saddam, a ascensão e queda do PT. Finalmente, a Tia Velha muda de partido, do nada! Agora, só faltam me dizer na sexta-feira que o petróleo do mundo acabou.

Real Brigada de Filibusteiros: suspensórios, política nacional, desvio de verba, superfaturamento, fotos de velhas, Basílica de São Pedro.

terça-feira, setembro 13

Um vai-pra-puta-que-pariu e um soco na fuça para…

  • …a imbecil da vizinha que fica o dia todo empoleirada na maldita sacada vigiando a vida alheia;
  • …o surdo idiota do vizinho da esquerda, seu maldito rádio demoníaco e seus malditos cds de música popular (bem itálico);
  • …a igreja de crente que tem no fim da rua e tem um alto-falante pra fora (1);
  • …a horda de ostrogodos que joga futebol todo dia no meu portão;
  • …a gente que se apinha e gosta de andar colada no transporte público;
  • …aos motoristas apressadinhos;
  • …as madames com seus cachorrinhos ridículos (2);
  • …os cachorrinhos ridículos e,
  • …todos os já consuetos.

(1) apesar de não-recomendável, um dos vizinhos saiu, há alguns anos, e despregou o alto-falante da parede da igreja a tiro (mereceria uma medalha, se não fosse tão troglodita). Porém, assim que os crentes souberam da sua morte, recentemente, reinstalaram a trombeta do demônio.
(2) poodles e bassês, prioritariamente.

Imperial pega-trouxa: cachorro de estimação, como criar escargots, sado-masoquismo, livros apócrifos, inquisição espanhola.

segunda-feira, setembro 12

Muito, mas muito malvado mesmo


Malvados, por indicação do Real Escritório de Censura.

domingo, setembro 11

Um onze de setembro bem melhor

O Onze de setembro de 1714, segundo Antoni Estruch

A primeira lei aprovada pelo Parlamento da Catalunha ao constituir-se em 1980 foi a que declara o onze de setembro feriado nacional da Catalunha, nos seguintes termos:

«(...) O povo catalão no tempo de luta, marcou uma data, a de onze de setembro, como a Festa de Catalunya. Jornada que, [pela qual] é significativa a lembrança da perda das liberdades, o onze de setembro de 1714, e uma atitude de reinvindicação e resistência ativa frente à opressão, supondo-se também a esperança de um restabelecimento nacional total.
«Agora, retomando a Catalunha o seu caminho de liberdade, os representantes do povo creem que a Câmara Legislativa há-de sancionar aquilo que a Nação unanimemente já assumiu.
«Por isso, o povo da Catalunha, pela podestade do seu Parlamento, estabelece a seguinte lei:

«Artigo primeiro: Declara-se Festa Nacional de Catalunya a jornada de 11 de setembro.
«Artigo segundo: Esta lei entrará em vigo no mesmo dia da sua publicação no Diário Oficial da Generalitat.

«Portanto, ordeno que todos os cidadãos aos quais seja de aplicação esta Lei, cooperem no seu cumprimento e que os tribunais e Autorizados aos quais seja pertinente, a façam cumprir.

Jordi Pujol, Presidente da Generalitat de Catalunya.
Joan Rigol, Conselheiro do Trabalho.
Barcelona, 12 de junho de 1980.

Do original, mais infomações (en català, naturalment) e como eles não são malvados, algumas informações em galego, o que já facilita bastante.

sábado, setembro 10

Queda-de-braço geopolítica e outras amenidades

  1. Quem é mais país? Nós, o Brasil-grande-auriverde ou a Generalitat de Catalunya? Convenhamos que dobrar a Espanha é mais fácil do que dobrar os Estados-Unidos.
  2. Só acredito civilizadas as línguas que tenham diacríticos; e ainda mais civilizadas as que têm cê-cedilha.
  3. «Catalão? E quem fala?» Na Europa, o português e o catalão têm o mesmo número de falantes. Machadada e cop de destral para o ouvido de um inglês devem soar da mesma maneira, ou seja, não têm importância alguma. Assim como Lisboa e Barcelona são duas cidades da Escandinávia do Magreb.

quinta-feira, setembro 8

Observações nada patrióticas

O Sete de setembro na televisão. Uniformes surrados e puídos, quiçá lustrosos de uso, uma fanfarra horrorosa - que quando da entrada da Cavalaria, no desfile do Rio, tocava a abertura de Gulherme Tell, o famoso tema das corridas de cavalo -, armamentos que não servem nem mais para dar fim aos blatídeos, caminhões mercedão 1111 e 1113. Se Sua Majestade Imperial fosse viva, chorava de desgosto. Que Deus a tenha, e que Deus tenha piedade de nós, brasileiros.

Tanque por tanque, fico com a minha lavadora automática.

A Esquadrilha da Fumaça fazendo um coração de fumaça nos céus de Gomorra, perdão, de Brasília, com fumaça cinza. Cor bem escolhida.

Eu faria suas excelências deputadescas desfilarem com as mãos para o alto, antecedidas por um blindado. No final, evidentemente, salva de tiros.

A única coisa que vos posso oferecer no dia da Pátria são lenços de papel auriverdes, para podermos chorar confortavelmente ao ver os próximos noticiários, tanto quanto já temos chorado.

quarta-feira, setembro 7

Campanades a morts

«Assassins! Assassins de raons, assassins de vides!
Que mai no tingueu repòs en cap dels vostres dies
i que en la mort us persegueixin les nostres memòries.»

(«Assassinos! Assassinos de razões, assassinos de vidas!
Que não tenhais mais repouso até o fim dos vossos dias
e que na morte vos persigam as nossas memórias.»)

L. Llach, Campanades a morts.

terça-feira, setembro 6

Aforismos, teorias e conseqüencias

Somos latinos, conseqüentemente não conseguiremos dar certo fora da bacia do Mediterrâneo. Sugere-se que voltemos todos às velhas fronteiras de Roma. Todos, porque é a língua que é a pátria e a origem.

segunda-feira, setembro 5

Entre aspas

E se um triste azar, me tolhe e caio à terra,
levai todos os meus cantos
e um ramo de flores vermelhas
a quem tanto estimei,
se ganharmos o combate.

(Abril de 74, Lluís Llach)

sexta-feira, setembro 2

Dez asnidades

  1. Crise política: afinal de contas, é sempre a mesma velha canalha, ajuntada agora dos vermelhos, «quando se chega ao poder, adeus Proust!, adeus, Brecht!». Uma solução para o país: explodimo-lo e façamo-lo novamente; eu posso contribuir com os meus instintos pirômanos.
  2. Problemas do sistema público de saúde: botem fogo nos hospitais. Todos os doentes serão tratados em mangues, imersos na lama e usando-se ainda de musicoterapia: Sidney Magal.
  3. Gorbatchóv pra presidente do Brasil.
  4. Eduardo Suplicy daria um perfeito Primeiro-Ministro. É uma pena que o cargo não exista.
  5. O ambiente de trabalho dos operadores de telemarketing seria muito mais produtivo se os empregadores, em toda sala de telefonistas, colocassem um grande retrato do saudoso Lênin - em pose ao vento - e convencer os empregadores de que eles estão ali por uma sociedade mais justa e igualitária, e a chave desse luminoso porvir é a venda de cartões de crédito. Viva a Mãe-Rússia, casa dos homens livres!
  6. Diretas pra Reitor; desde que possamos queimar o precedente em praça pública ao som solene duma banda marcial tocando Besame mucho.
  7. Uma estátua do Machado de Assis bem no meio da praça Sílvio Romero.
  8. CLT é regime para pederastas imbuídos de e embebidos em cursos de vendas; eu quero é ser estatutário!
  9. A Burocracia existe para tentar manter um pouco de ordem na pressa dos porcos desta imensa pocilga que é o Brasil-il-il.
  10. Nunca seremos nada: nossa Independência foi proclamada por um príncipe mimado de camisolão que brigou com o pai; nossa República, por um Marechal monarquista com apendicite; tivemos um Regime Militar que foi uma sucessão de generais enrugados que prefeririam estar pescando ou montando cavalos a governar; tivemos um presidente toxicômano - emérito cafungador! Talvez seremos algo sim, no futuro, quando o Brasil se descolar da América do Sul e começar a afundar, obliquamente, no Atlântico.

Irene

Irene
(L. Llach)

No, no he volgut pintar
el teu cabell llarg
ni les teves mans.

Ni el teu cos, que he envoltat
d'ones que he robat
al mar abrivat.

No, no he volgut pintar
aquest despertat
serè, deslliurat.

Ni el primer cant d'ocell
que ens acosta el vent
abans de l'adéu.

I ara que el temps se m'emporta
i em tanques la porta
per on vaig entrar,
no, no vull recordar
ni la teva imatge
ni les teves mans,
No, no em puc aturar
i mirar la vida
des del finestral.

No, no vull trepitjar
fulles que em recorden
el teu caminar.

No, ja no vull tornar
al camí que em porta
a la teva llar.

I ara que queda enrera
aquella drecera
per on vam passar,
no, no vull recordar
ni la teva imatge
ni les teves mans.
No, no em puc aturar
i mirar la vida
des del finestral.

Irene

Não, eu não quis pintar
teus cabelos longos
nem as tuas mãos.

Nem o teu dorso, que envolvi
de ondas que roubei
do mar agitado.

Não, eu não quis pintar
este despertar
sereno, liberto.

Nem o primeiro canto de pássaro
que nos traz o vento
antes do adeus.

E agora que o tempo se me vai
e me fechas a porta
por onde vais entrar,
não, não quero me lembrar
nem da tua imagem
nem das tuas mãos.
Não, não posso suportar
e olhar a vida
desde o vitrô.

Não, não quero pisar
folhas que me lembrem
do teu caminhar.

Não, já não quero voltar
ao caminho que me leva
ao teu lar.

E agora que fica pra trás
aquele atalho
por onde passamos,
não, não quero me lembrar
nem da tua imagem
nem das tuas mãos.
Não, não posso suportar
e olhar a vida
desde o vitrô.