terça-feira, outubro 25

207. Um trinco no monolingüismo monolítico

Do Portal Galego da língua.

No último 22 de novembro [de 2002], foi aprovada pela Câmara do Vereadores de São Gabriel da Cachoeira a Lei de Co-oficialização do Nheengatu, Tukano e Baniwa no município, localizado no alto Rio Negro (AM).
Trata-se da primeira vez na história do Brasil que uma (neste caso três) línguas indígenas são elevadas, por lei, ao status de língua oficial. O projeto foi solicitado ao IPOL pela Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), entidade fundada em 1984 e que congrega 42 associações indígenas durante sua assembléia geral de janeiro de 2000, na presença de 513 delegados.
O trabalho foi feito por uma equipe do Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Lingüística – IPOL, em conjunto com o advogado Márcio Rovere, e desenvolveram o conceito de co-oficialização para sinalizar total respeito ao artigo 13 da Constituição Federal, pelo qual o português é a língua oficial da União. Pelo projeto apresentado, todos os órgãos da prefeitura e dos demais poderes sediados no município, inclusive a iniciativa privada, devem dispor de funcionário para atender aos cidadãos em português e nas três línguas co-oficiais; a documentação da prefeitura deve ser produzida nas quatro línguas; todas as escolas sediadas no município ensinarão pelo menos uma das línguas indígenas co-oficiais, mesmo que não sejam escolas indígenas, além de outros pontos.
As medidas têm um prazo de cinco anos para entrarem em vigor, prazo no qual a equipe do IPOL continuará trabalhando, com a FOIRN e outras entidades da sociedade civil, de maneira a disponibilizar recursos, gerar corpo técnico para a elaboração das traduções, etc. A aprovação dessa lei (145/2002) é de grande importância no contexto das discussões sobre o Projeto de Lei dos Estrangeirismos, porque mostra exatamente como a legislação pode ser utilizada para o fomento e a defesa da diversidade e da pluralidade, e não o contrário. São Gabriel da Cachoeira é possivelmente o lugar mais plurilíngüe das Américas: um município de 112.000 km quadrados (maior que Portugal ou Santa Catarina) onde se falam 22 línguas indígenas diferentes, de 4 troncos lingüísticos direfentes (Tupi-Guarani, Tukano Oriental, Maku e Aruak). Além disso, é possivelmente o único lugar no mundo em que o critério de casamento tradicional (no caso dos povos Tukano) é lingüístico (exogamia lingüística: um homem não pode se casar com uma mulher falante da mesma língua que ele). O IPOL atua na região desde 1997, quando um dos seus integrantes, Gilvan Müller de Oliveira, esteve como docente do Curso de Magistério Indígena da Prefeitura Municipal, no qual se formaram os primeiros 163 professores indígenas que atuam nas escolas públicas da região.
Atualmente a equipe do Rio Negro é formada por 4 pessoas (Maurice Bazin, Silvia de Oliveira, Andréa Scaravelli e Gilvan Müller de Oliveira). Sua atuação se dá em parceria com o ISA - Instituto Socioambiental, ONG que desenvolve vários projetos na região- São Gabriel da Cachoeira é um município de ampla maioria indígena (cerca de 95% da população é indígena) e que esse é o caso de vários outros municípios no Brasil.
Primeira ONG brasileira dedicada à política lingüística, fundada em 1999 e tendo por sede Florianópolis, no sul do país, o IPOL atua em seis programas de trabalho: Línguas Autóctones, Línguas Alóctones, Gestão Escolar da Língua Portuguesa, Segunda Língua, Lusofonia e Mercosul. É uma entidade sem fins lucrativos, composta por membros de várias especialidades, e que tem criado e administrado bancos de dados sobre as línguas brasileiras do ponto de vista dos direitos lingüísticos dos cidadãos.

Página do IPOL. Página do Portal Galego da Língua.

Só para complementar:
Da Constituição da República Federativa do Brasil (1988):
Art. 13. A língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil.

Louvável a intenção do IPOL, mas as minhas dúvidas são realmente quanto à legalidade da decisão, visto que o artigo 13 da Constituição é hermético e no título III, capítulo IV da mesma legislação, não é incluïda como atribuições municipais legislar sobre política língüística. Infelizmente não encontrei o texto da lei municipal de São Gabriel da Cachoeira para poder ver como foi redigido, já que é citado que não vai de encontro à Constiruição Federal. Gostaria de ver o texto e compreender o conceito de co-oficialização e ver como funciona; talvez seja o mesmo passo para outras comunidades minoritárias poderem afirmar sua língua e sua cultura.

3 Comentários:

Blogger Sérgio disse...

Diversidade lingüística, Donato. Que seria do mundo se falássemos uma única língua? Seria um horror. Além do mais, há-de ser encarado como facto concreto, as línguas que existem fora do «circuito comercial».

quarta-feira, outubro 26, 2005 10:07:00 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Comove-me. Você não pode ver os meus olhos, mas estão marejados e vermelhos. Meus genes andaluzes agitam-se num fervor cristão que faz jus a suas origens. É sem dúvida de uma piedade imensa deixar que os índios agonizem em sua própria língua.

quarta-feira, outubro 26, 2005 11:24:00 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

o melhor é saber q nem td q envolve lingüística tem a ver com árvores e palavras incompreensíveis.

quarta-feira, outubro 26, 2005 8:29:00 da tarde  

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